sexta-feira, 30 de março de 2012

MAIS MILLÔR

Este é outro texto de que me lembrava bastante bem:

Temos que ser realistas e humanos com relação à situação presidiária do país. Realistas para declarar que possuímos um dos piores sistemas penitenciários do mundo. Humanos para tentar melhorá-lo A reforma do nosso sistema carcerário teria efeitos revolucionários. Acredito mesmo que o péssimo estado de muitas de nossas prisões é o que as impede de serem ocupadas por algumas pessoas de nossa melhor sociedade.

CONVERSA COM DIDU DE SOUZA CAMPOS (HOMEM DO SOCIETY QUE, COM TEREZA DE SOUZA CAMPOS, FORMOU O CASAL 20).
1959

MILLÔR



Se há livro que devo incluir nas minhas referências este é sem dúvida um deles. Li-o há muitos anos, quando apenas escrevia na minha cabeça. Há excertos que ainda hoje me lembro quase na íntegra, como o que incluo a seguir.



"Um cego apura profundamente seu senso de audição. Essa afirmativa desvairada de otimistas que estão sempre buscando uma compensação impossível para os desastres naturais e os espantosos erros da natureza, só pode ser ratificada e apoiada por um exemplo ainda mais visível da lei das compensações: um indivíduo com uma perna mais curta do que a outra tem sempre, infalivelmente, a outra perna mais comprida."
MANIFESTO CONTRA A NATUREZA. 1956

E outros que leio agora como se fosse a primeira vez :) e me fazem rir e chorar

"No Brasil, atualmente, só há um extremismo perigoso: o dos indivíduos extremamente conservadores."
CONVERSA COM FERNANDO SABINO, JORNALISTA, ROMANCISTA.



quinta-feira, 29 de março de 2012

quarta-feira, 28 de março de 2012

BREVE ENSAIO SOBRE A POTÊNCIA (EXCERTOS)

(...)

3

nenhum homem que atravesse
o eixo mais ao centro. a espuma
produz-se onde a saudade é uma
cabeça filtrada pla desgraça.
forma-se ideias na direcção da
cor: os peixes acreditam que o
sal é uma excrecência da luz.

(...)

17

O homem usa o boi e a evidência
e troca no mercado a luz do vício.
Lava poucas vezes o cabelo embora
não saiba que o desamor faz mal; e o
futuro inveja-o por isso. Tem uma dor
nas costas do trabalho e queixa-se
da alma que nunca soube onde fica.

(...)

29

Os anjois são recicláveis e a literatura
controla o tráfego aéreo. No porão do
pensamento acenamos à suavidade,
enquanto Deus é uma sala de fisioterapia.
Conservamos as fábricas de electricidade
em níveis aceitáveis de educação sentimental.
Somos homens negros paridores da luz.

[...]

Rui Costa (mais sobre rui costa e poemas)

[ao contrário do que tento sempre, dizer menos do que quero dizer, o Rui Costa usava a escrita como um centro de atracção, o poema como um buraco negro, capaz de convocar a realidade ao mesmo tempo que a criava. Discutimos algumas vezes, ele era mais sábio do que eu, ou apenas via melhor do que eu, mas nele, tal como em mim, gosto de acreditar, a luz e a escuridão nunca se separavam e partilhavamos/partilhamos o gosto pela experimentação e pelos limites.]

segunda-feira, 26 de março de 2012

PORTUGAL



Olho a fotografia e recordo-me daquele filme do Woody Allen em que um personagem tinha dificuldades em manter-se focado. Eu e o Paulo Pires lemos Portugal, um poema de Jorge Sousa Braga e o esforço para nos mantermos focados é evidente. Foi no Dia da Poesia, no Bar Catita & Companhia, em Olhão.
Obrigado Abel, pela foto.

domingo, 25 de março de 2012

sábado, 24 de março de 2012

sexta-feira, 23 de março de 2012

quinta-feira, 22 de março de 2012

quarta-feira, 21 de março de 2012

o que é a poesia


A ema vinha e depois ia, sempre em grande correria, e eu dei por mim a pensar que o pó que a ema levantava quando se ia, era, ao mesmo tempo, poema e poesia.

terça-feira, 20 de março de 2012

DECLARAÇÃO PARA OS EFEITOS TIDOS POR CONVENIENTES



Não me interessa a poesia nem os poetas
e muito menos
a sua vida
Interessa-me a penas a poesia que existe
na vida de todos
os dias
e que às vezes
atravessa inadvertida
os poemas
e os poetas

Luís Ene




segunda-feira, 19 de março de 2012

Manoel de Barros

Poesia, s.f.




Raiz de água larga no rosto da noite

Produto de uma pessoa inclinada a antro

Remanso que um riacho faz sob o caule da manhã

Espécie de réstia espantada que sai pelas frinchas de

um homem

Designa também a armação de objectos lúdicos com

emprego de palavras imagens cores sons etc.

geralmente feitos por crianças pessoas esquisitas

loucas e bêbados





O POETA



Vão dizer que não existo propriamente dito.

Que sou ente de sílabas.

Vão dizer que eu tenho vocação pra ninguém.

Quem acha bonito e pode passar a vida a ouvir o som

das palavras

Ou é ninguém ou é zoró.

Eu teria treze anos.

De tarde fui olhar a Cordilheira dos Andes que

se perdia nos longes da Bolívia

E veio uma iluminura em mim.

Foi a primeira iluminura.

Daí botei o meu primeiro verso:

Aquele morro bem que entorta a bunda da paisagem.

Mostrei a obra pra minha mãe.

A mãe falou:

Agora você vai ter que assumir as suas

Irresponsabilidades.

Eu assumi: entrei no mundo das imagens.

 
Manoel de Barros

sexta-feira, 16 de março de 2012

Dois tipos de portugueses

Há dois tipos de portugueses: os que são e os que não são.
Por sua vez os que não são dividem-se em dois tipos: os que deixaram de ser e os que nunca foram.
E os que deixaram de ser ainda podem ou não voltar a ser, assim como os que nunca foram podem talvez vir a ser ou nunca serão.
Já os que são, são, ou então não são.

quinta-feira, 8 de março de 2012

ARTE DE SER

não te iludas
para ser é preciso
querer

não tenhas a menor
dúvida

mas tem cuidado
muito cuidado

não vás querer
ser quem
não és


Luís Ene

quarta-feira, 7 de março de 2012

PORTUGAL EM POEMAS (2)

Portugal Futuro

O portugal futuro é um país
aonde o puro pássaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharão a giz
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e lhe chamem elas o que lhe chamarem
portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos à raiz
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verão
Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o portugal futuro

in “Homem de Palavra[s]”, 1969, de Ruy Belo

[Sobre Ruy Belo]

SER PORTUGUÊS OU O PORTUGUÊS SEM FILTRO

Os portugueses espalhados pelo mundo sentem sempre saudade da ditosa pátria sua amada, aquele lugar triste onde nasceram e onde cedo conheceram o exílio.

terça-feira, 6 de março de 2012

PORTUGAL EM POEMAS - 1

[Foi a Paula que me chamou a atenção para este poema e me pôs a caminho...]



A PORTUGAL - JORGE DE SENA



Esta é a ditosa pátria minha amada. Não.

Nem é ditosa, porque o não merece.

Nem minha amada, porque é só madrasta.

Nem pátria minha, porque eu não mereço

A pouca sorte de nascido nela.



Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta

quanto esse arroto de passadas glórias.

Amigos meus mais caros tenho nela,

saudosamente nela, mas amigos são

por serem meus amigos, e mais nada.



Torpe dejecto de romano império;

babugem de invasões; salsugem porca

de esgoto atlântico; irrisória face

de lama, de cobiça, e de vileza,

de mesquinhez, de fatua ignorância;

terra de escravos, cu pró ar ouvindo

ranger no nevoeiro a nau do Encoberto;

terra de funcionários e de prostitutas,

devotos todos do milagre, castos

nas horas vagas de doença oculta;

terra de heróis a peso de ouro e sangue,

e santos com balcão de secos e molhados

no fundo da virtude; terra triste

à luz do sol calada, arrebicada, pulha,

cheia de afáveis para os estrangeiros

que deixam moedas e transportam pulgas,

oh pulgas lusitanas, pela Europa;

terra de monumentos em que o povo

assina a merda o seu anonimato;

terra-museu em que se vive ainda,

com porcos pela rua, em casas celtiberas;

terra de poetas tão sentimentais

que o cheiro de um sovaco os põe em transe;

terra de pedras esburgadas, secas

como esses sentimentos de oito séculos

de roubos e patrões, barões ou condes;

ó terra de ninguém, ninguém, ninguém:

eu te pertenço. És cabra, és badalhoca,

és mais que cachorra pelo cio,

és peste e fome e guerra e dor de coração.

Eu te pertenço mas seres minha, não.



Jorge de Sena

[LER JORGE DE SENA]

SILOGISMO




O poeta procura a solidão ou a solidão
procura-o?

O poeta encontra a solidão ou a solidão
encontra-o?

A verdade é só uma, mas percorre sempre
múltiplos caminhos.

Nem sempre procuramos o que
encontramos.

Nem sempre encontramos o que
procuramos.

O poema encontra afinal o que
não procura.

O poema procura afinal o que
não encontra.

O poema não é pergunta nem
é resposta.

O poema é um lugar
ermo.

A solidão do poeta é
a solidão do poema.

[Luís Ene]

segunda-feira, 5 de março de 2012

O POEMA

O poema pode ser público
o poema pode ser privado
pode ir sempre em frente
pode avançar de lado
O poema pode ser
aquilo que bem quiser
prato de sopa cheio
ou simples colher
o poema pode ser tudo
só não pode ser
mentira

CERTEZA

Olho com espanto
repetido
a ilha que se move
na linha do horizonte

E de nada me
adianta
saber que é
afinal um barco

A poesia não é
mais do que
a verdade à procura
de si mesma

[...]


sábado, 3 de março de 2012

[...]

escreve-se o poema
para que ele nos faça
dizer

o que de outra forma
nunca conseguiríamos
ouvir

quinta-feira, 1 de março de 2012

SER PORTUGUÊS OU O PORTUGUÊS SEM FILTRO

[...]

Se existisse um super-herói português estou certo que diria que com um grande poder vem uma grande irresponsabilidade.

(em construção)

Cruzeiro Seixas

 Ouvir.