Poesia, s.f.
Raiz de água larga no rosto da noite
Produto de uma pessoa inclinada a antro
Remanso que um riacho faz sob o caule da manhã
Espécie de réstia espantada que sai pelas frinchas de
um homem
Designa também a armação de objectos lúdicos com
emprego de palavras imagens cores sons etc.
geralmente feitos por crianças pessoas esquisitas
loucas e bêbados
O POETA
Vão dizer que não existo propriamente dito.
Que sou ente de sílabas.
Vão dizer que eu tenho vocação pra ninguém.
Quem acha bonito e pode passar a vida a ouvir o som
das palavras
Ou é ninguém ou é zoró.
Eu teria treze anos.
De tarde fui olhar a Cordilheira dos Andes que
se perdia nos longes da Bolívia
E veio uma iluminura em mim.
Foi a primeira iluminura.
Daí botei o meu primeiro verso:
Aquele morro bem que entorta a bunda da paisagem.
Mostrei a obra pra minha mãe.
A mãe falou:
Agora você vai ter que assumir as suas
Irresponsabilidades.
Eu assumi: entrei no mundo das imagens.
Manoel de Barros