O piano aprendeu a calar-se perante
a majestosa imponência do mar. Só a pianista, tão silenciosa quanto ele, era
capaz de lhe emprestar a sua voz.
A pianista tinha uma filha, mas o
piano não era o pai, por muito que lhe custasse. Talvez por isso o seu som
fosse sempre triste, ainda que apaixonado.
Quando ela morreu, o piano morreu
também. Ainda se suspeitou de suicídio, mas, fosse como fosse, todos sabiam que
tinha sido o desgosto que o matara.
A pianista trocou teclas por sexo,
antecipando-se à sua neta que muitos anos mais tarde trabalharia numa linha erótica.
O piano era a voz do silêncio,
poema materializado dos seus sonhos e das suas angústias. Com o piano ela
aprendeu a falar, com o piano ele aprendeu a calar-se.
Ele não era pianista e ela de
certeza não era um piano, no entanto as mãos dele no corpo dela despertavam uma
música sublime.