III
A Prisão do Ético, livro de estreia de Paulo Rodrigues Ferreira contém um conjunto de textos breves que podem ser facilmente classificados como microficções e o mesmo autor tem uma pratica digital já longa de produção de outros tantos textos que dificilmente receberiam outra classificação. No entanto, é o próprio autor que se esquiva a essa classificação, afirmando que “Acho que não me encaixo na micronarrativa. Sou demasiado eclético para ser apenas cento e quarenta caracteres de texto, uma página ou o que quer que seja. Muitas vezes, digo micronarrativa para usar um código que seja facilmente entendido por quem me ouve ou lê. A Prisão do Ético, por exemplo, se tem uma segunda parte mais directa, com textos mais curtos, mais facilmente identificáveis com a «micronarrativa», a primeira não tem nada de micronarrativa.”
Mais uma vez deparo com um autor de microficções que se esforça por negá-lo, como se escrever microficções fosse um estigma, e mais uma vez me surpreendo.
Paulo Rodrigues Ferreira e Rui Amaral, ainda que com nuances, recusam-se assim não só a ser classificados como microficcionistas, mas também a admitir que as escrevem. Não pretendendo fazer qualquer juízo de valor sobre essa atitude comum e sendo que ambos escrevem com regularidade textos de ficção breves que podem muito bem ser classificados como microficções, não posso deixar de interrogar porquê esta sua atitude de negação da microficção.
Quererão afinal negá-la apenas como género, mas aceitando a existência isolada de textos breves de ficção que não se incluem nos géneros tradicionais?
Eles não negam a literariedade dos seus próprios textos, apenas parecem recear que eles sejam classificados como microficções. O que quererá isso dizer?
[CONTINUA AINDA]