Vem daí, vem comigo
escreverei com todos os sentidos
de fora para dentro, de dentro para fora
para que me possas seguir com facilidade
Na linha do horizonte à minha frente
mar e céu fundem-se e confundem-se em azul
Abro muito os olhos e vejo aves que nadam no mar
e peixes que voam pelos céus
Atravesso a linha do comboio
como quem atravessa uma fronteira
é final de Agosto, está calor
mas sopra uma brisa refrescante
o azul chama-me, insistente
Caminho para ele estrada abaixo
atraído, consumido por ele
Um barco em terra
Um pomar de sequeiro
A estrada ladeada de jovens árvores vindas de longe
Avanço a custo
muros vedações edifícios
levantam-se em puro caos
e o único caminho
que me poderia levar mais perto
do azul intenso em que me quero
perder dissolver desaparecer
está guardado por um cão feroz
que me ladra ameaçador
Aceito a realidade
volto para trás
sobre os meus passos
atravesso de novo a linha do comboio
e sigo agora entre vedações
por um caminho de terra à sombra
de pinheiros mansos mas altivos
até à casa poema sonhada e realizada
por um fantasma
Estou só mas não sozinho
ouço o zumbir das cigarras
o ruído surdo de um carro
que avança sobre cascalho
sinto cheiros antigos
o vento acaricia-me a pele
despenteia-me o cabelo
subo de novo à varanda da casa poema
sentado à sua frente
de costas para ela
os olhos abertos no caderno em que escrevo
e encho-me finalmente de azul
o azul do céu o azul do mar
o azul da tinta com que escrevo este poema
Adeus!