domingo, 29 de agosto de 2010

Achas que és escritor?

[lê o estado da literatura - responde ao questionário.]


Interessam-me mais as perguntas do que as respostas e evito respostas definitivas. É claro que às vezes é conveniente saber do que estamos a falar e criar, para esse efeito, alguns consensos.

Há alguns anos atrás, quando eu tinha mais dúvidas do que agora sobre esse assunto, um amigo interrogava-me constantemente sobre o que é ser escritor e quando eu avançava com algumas respostas (provisórias) ele abanava-as uma a uma, para meu desespero.

Ser escritor é um estado, uma maneira de ser, e não uma profissão (embora existam escritores que fazem da escrita profissão). Assim, não me parece que para se ser escritor se tenha de viver da escrita, ou sequer ganhar com a escrita. Da mesma forma, para se ser escritor não se tem de estar publicado, em livro ou revista.

Uma questão que me parece interessante – talvez das únicas - é a de saber se a publicação em blog de originais deve ou não ser considerada publicação para se dizer que um determinado escritor é ou não um escritor publicado. Não vejo muitos escritores que publicam em blogues fazerem essa referência no seu curriculum.

Escritor é aquele que se diz escritor e/ou é reconhecido como tal. Esclareça-se que os escritores (quase todos) ganham pouco dinheiro com as suas publicações, a grande maioria muito pouco ou nada e alguns até pagam para ser publicados.

Por isto (nesta investigação) falo apenas em escritores e nem os distingo, como poderia fazer (poetas, contistas, romancistas...). Prefiro deixar os termos abertos a fechá-los. Prefiro que os investigados avancem com as suas próprias definições.

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Escritor ô)
s. m.
1.Autor de obras literárias ou científicas (com relação ao estilo, à forma que emprega).
escritor público: literato de profissão.

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Curiosamente, não encontrei no Citador qualquer citação ou pensamento com o tema escritor, mas recomendo os pensamentos com o tema escrita.

Deixo aqui um:

Senta-te diante da folha de papel e escreve. Escrever o quê? Não perguntes. Os crentes têm as suas horas de orar, mesmo não estando inclinados para isso. Concentram-se, fazem um esforço de contensão beata e lá conseguem. Esperam a graça e às vezes ela vem. Escrever é orar sem um deus para a oração. Porque o poder da divindade não passa apenas pela crença e é aí apenas uma modalidade de a fazer existir. Ela existe para os que não crêem, como expressão do sagrado sem divindade que a preencha. Como é que outros escrevem em agnosticismo da sensibilidade? Decerto eles o fazem sendo crentes como os crentes pelo acto extremo de o manifestarem. Eles captarão assim o poder da transfiguração e do incognoscível na execução fria do acto em que isso deveria ser. Escreve e não perguntes. Escreve para te doeres disso, de não saberes. E já houve resposta bastante.

Vergílio Ferreira, in "Pensar"

Cruzeiro Seixas

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