quarta-feira, 10 de junho de 2009

perdidos e achados



Pergunto-me mais uma vez por que escrevo, e mais uma vez respondo da mesma forma: Mas o que é que isso interessa? Escrever é resposta mais do que suficiente. No entanto, a razão porque escrevo não deve ser muito diferente da razão porque leio: para viver mais. E o que escrevo e o que leio aproximam-se cada vez mais, pelo menos se tiver em consideração o que gosto de ler e de escrever, o que procuro ler e escrever - como se ler e escrever fossem para mim cada vez mais o mesmo território em que me movo. Sinto que não me estou a explicar bem, mas talvez possa dizer que o que escrevo (ou procuro escrever) determina cada vez mais o que leio (ou procuro ler) e o contrário será igualmente verdadeiro. Neste contexto gostaria de falar do que tenho lido, mais do que tenho escrito, de uma forma que me cativa cada vez mais, misturando e confundindo sujeito e objecto, realidade e ficção.

Acontece-me muitas vezes procurar um livro e encontrar outro, o que também me acontece quando escrevo, ainda que por razões diferentes, porque o livro que escrevo nunca é aquele que queria escrever. E se não escrevemos os livros que queremos, mas os livros que somos capazes de escrever,como dizia Borges, já quanto aos livros que lemos, a dificuldade é muitas vezes não só encontrá-los, mas encontrá-los no momento certo, no momento em que estamos mais preparados para os ler; se ler é lermo-nos, escrever é também escrevermo-nos, e para ambas as acções existe sem dúvida o momento certo, o momento em que o texto e o seu leitor/escritor se encontram mais próximos. Mas sinto que estou novamente a ser pouco claro, o que sempre me acontece quando escrevo, ainda que escreva (ou tente escrever) com o propósito oposto.

A dificuldade em encontrar um livro para ler, excluída aquela que consiste em saber que esse livro existe (situação que poderá até levar a querer escrever um livro que já foi escrito), é para mim a de esse livro se encontrar ou não na biblioteca local, ou de estar disponível ou não nas livrarias que frequento (raramente encomendo pela Internet) e, o que não é menos importante, apresentar-se a um preço acessível. O preço acessível é importante e tem feito a diferença, e neste aspecto é preciso dizer que os livros em Portugal são habitualmente demasiado caros, não existindo normalmente opções para o mesmo livro entre uma edição de luxo e outra mais barata. Da mesma forma os ditos clássicos raramente se oferecem em versões económicas. Como exemplo, encontrei no outro dia um livro de um jovem jornalista e escritor italiano contemporâneo, na sua língua de origem, por menos de metade do preço da edição portuguesa. Como preferia ler em português não comprei. Por outro lado, tive bastante dificuldade em encontrar (sem recorrer a encomendar o livro) o Moby Dick, de Herman Mellville, e comprei-o muito mais caro do que gostaria. Teria muito mais para dizer, mas só quero sublinhar a ideia de que raramente encontro os livros que procuro e que normalmente os encontro quando não os procuro, e é fácil de perceber que a segunda situação me agrada mais do que a primeira.

Desta vez aconteceu-me não tanto com um livro mas com um autor: Hunter S. Thompson. Procurava livros de Leo Tolstoi a um preço económico, para um clube de leitura a dois, mas não encontrei nem um e, ao procurar na letra T dei de caras com um livro de Hunter S. Thompson, autor que não sabia publicado em português e que queria ler. Na verdade, existem dois livros publicados em português, mas na livraria em que procurei só tinham um, e como o preço me pareceu bastante acessível, ainda mais se consideramos a relação preço qualidade (quanto ao livro objecto), comprei-o sem hesitações, porque há muito que me interesso pelo que é habitualmente designado por jornalismo literário ou literatura de não ficção, sem dúvida porque a relação entre quem escreve e o que escreve e entre a realidade e a ficção me parece das mais fecundas e das mais misteriosas. Tenho quase a certeza que sou o que escrevo e escrevo o que sou, e isto quer eu escreva ficção ou quer eu escreva não ficção, como neste texto que aqui acaba (ou que aqui começa).

PS. Tentem fazer uma busca na Internet a procurar livros deste autor editados em Portugal e verão a dificuldade em encontrá-los, mesmo no site da editora que os publicou.



site dos hell's angels

pps. o livro custou-me 7.50 Euros

Cruzeiro Seixas

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